49 anos

Crónica de Opinião
Quinta-feira, 27 Abril 2023
49 anos
  • Nuno do Ó

 

Anteontem mesmo, comemorámos o 49º aniversário do 25 de abril. Por incrível que nos possa parecer, já vivemos em democracia há mais tempo do que durou a ditadura.
48 anos de ditadura Salazarista, aquela que alguns insistem em tentar fazer esquecer, a da miséria e da fome, no Alentejo, no país rural, com os pés descalços, a da imigração forçada, a da guerra, a do colonialismo e da exploração de outros povos, mesmo dos nossos, que para outras terras eram exportados, desenraizados, porque aqui mesmo, pouco crescia.
A não ser a riqueza de alguns, de muito poucos, dos Champalimauds, dos Espíritos Santos e de tantas outras famílias, que enriqueceram à custa da exploração do subjugado povo, do trabalho dos outros e das benesses da ditadura, nos negócios do petróleo e noutros, gentilmente oferecidos a essas famílias, que retribuíam com o apoio à ditadura.
Esses mesmos que voltaram anos mais tarde, com a ajuda dos amigos nos governos, para voltarem a enriquecer, com simpáticas indeminizações, com a recuperação do produto dos roubos e das benesses, parecidas com estas que agora vamos oferecendo aos da TAP e a outros, que os explorados voltam a pagar, outra vez.
Muita coisa falhou, nestes 49 anos.
Mas tantas outras coisas venceram e ficaram, talvez as mais importantes conquistas, que não poderemos esquecer, nunca. A democracia e a liberdade não falharam. O Serviço Nacional de Saúde, também não, mesmo que atacado todos os dias. O ordenado mínimo nacional, criado a 27 de maio de 1974, pouco depois da revolução. Até ali, a esmagadora maioria dos trabalhadores laboravam em condições deploráveis, mal remunerados, pobres e explorados, até que não pudessem trabalhar mais. Aí tinham a fome e a miséria como garantia.
A fome e a miséria que levavam tantos alentejanos a terminarem mais cedo a vida, na sombra dolorosa de um chaparro amigo, incapazes de suportar a vergonha de ficarem no largo da Praça, sem esperança, dispensados da jorna, trocados por outros mais jovens e mais fortes, que a esse tempo chegariam também, porque também não teriam as reformas e as pensões que hoje damos como garantidas.
Apesar disso, ficou o voto livre, a liberdade de expressão, a liberdade de reunião, de manifestação, de comemorar a liberdade e o dia do trabalhador. Ficou a liberdade das mulheres, de puderem votar, de poderem sair do país sem autorização do marido.
Graças talvez a Álvaro Cunhal e a outros construtores da democracia, os que evitaram a guerra civil em 75, com a famosa declaração de Melo Antunes, que afirmava à RTP, a 26 de Novembro, que era indispensável a participação do Partido Comunista na construção do socialismo, contrariando assim os já saudosos da ditadura que na altura já pediam a sua ilegalização, com a consequente guerra civil que se adivinhava e para o que muitos já se preparavam, como aliás Mário Soares chegou a confessar publicamente, afirmando que estaria pronto para tudo e que contava com as armas dos ingleses para o efeito. A lucidez desses democratas salvou-nos de nos matarmos uns aos outros, numa guerra civil que seria como todas as outras, sem vencedores. Também isso nos trouxeram os revolucionários e a revolução.
É certo que Melo Antunes, Conselheiro da Revolução, afirmava uma transição para o socialismo em democracia, descartando qualquer retorno direto ou indireto às formas de organização capitalista da sociedade, que na altura considerou para sempre cortadas. Isso falhou.
Por aqui também muita coisa falhou e tem falhado. Os designados socialistas que aqui chegaram ao poder autárquico, trataram rapidamente de acabar com a esperança e com a economia da cidade, comprometendo um futuro, que apesar de tudo, sempre foi visível. Nem arrependidos ficaram e já trataram de o repetir aqui bem perto. O povo entretanto, foi pagando a fatura e aqui chegados, com a esperança à vista, já há quem salive com o que conseguimos reerguer.
Enquanto uns tentam acabar com a esperança, outros insistem em fazê-la renascer, nem que chovam picaretas. Levou uma década a recuperar dos estragos. Do PAEL e dos castigos impostos à falência do Município, da proibição de contratar trabalhadores ou de se poder investir o que fosse, passámos para um outro momento, de renascimento da esperança, que até faz lembrar os anos seguintes ao 25 de abril, aqui mesmo.
Novamente renascidos e apesar de tudo, já se constrói um novo hospital central, a ligação férrea Sines-Caia, o IP2 que se prepara, o Plano Local de Habitação, com 60 milhões de euros já programados para garantir habitação condigna a todos ou a Capital Europeia da Cultura, que brilhantemente a cidade venceu e que mudará o seu paradigma, uma vez mais, tal como já o tínhamos feito, com a descentralização cultural, o Centro Cultural de Évora ou a classificação de Évora como Património da Humanidade.
Tudo isto tem uma razão e responsáveis, que bem sabemos quem são. Mesmo com tudo o que falhou, continuamos a erguer o cravo e a não esquecer, a acreditar no povo e a lutar por ele, apenas por ele. Por tudo isso, vamos comemorar o dia do trabalhador, no 1º. de maio.

Até segunda!

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