Viva
Continuando com o tema iniciado na semana passada, gostava de vos continuar a falar do Teatro e da Infância.
Se encararmos que o desenvolvimento da autonomia está ligado à capacidade de brincar e de improvisar, iniciando-se durante a primeira infância, o jogo do faz de conta, desenvolve-se tendo por base as representações e as situações vividas. A criança representa o que lhe é dado a ver, a ouvir e a participar. Começa por retratar situações da vida familiar dando-lhes representações, nem sempre coincidentes com as realidades. Estas são moldadas às suas necessidades, confundindo-as, frequentemente com as fantasias. E é esta questão que, muitas vezes é esquecida, nos espetáculos destinados ao público mais jovem. São os longos textos com pretensões didáticas, nem sempre conseguidas, e a utilização de vocábulos elaborados e muitas vezes desconhecidos dos mais novos, que os afastam desta arte. O pensamento infantil não se encontra estruturado para compreender o que lhe é dado a ver e a ouvir.
Mas, por vezes, o oposto também acontece.
Ao cair-se no infantilismo, em nada se contribui para a formação de personalidades que se querem livres, criticas e interventivas.
Chamar ao teatro para crianças de “teatro infantil” talvez não seja o mais correto. O teatro não é infantil, mesmo dirigido às crianças não é uma arte menor, bem pelo contrário. Estas são um público exigente e sem filtros, dizem o que pensam e o que sentem.
Mas o teatro para crianças é, quase exclusivamente, feito por adultos. Mesmo escolhendo alguns textos adequados as faixas etárias a que se destinam, durante as representações primam em manter as crianças sentadas e quase sempre em silêncio. Esporadicamente é lhes pedida alguma interação para logo em seguida voltar a ser pedido silêncio. Esquecem-se que é muito difícil entenderem estas bruscas mudanças de posturas.
Como lhes podemos pedir silêncio por uma hora, ou mais?
Assistir a um espetáculo cénico não pode ser um castigo, nem uma tortura.
A espontaneidade, quando solicitada, é quase em simultâneo travada o que se torna difícil fazê-los entender qual o comportamento que lhes é pedimos. O excesso de silencio é, quase sempre, um contributo para o alheamento e para o direcionar da atenção para um outro qualquer interesse mais agradável e menos maçador.
A exceção ao teatro para crianças, feito pelos adultos, é aquele que as crianças fazem nas festas escolares, tão do agrado das famílias. Mas estas representações continuam a ser instrumentos de propaganda do trabalho dos professores e domesticação dos alunos. A aposta no caráter religioso de algumas récitas continua a ser mantido nas escolas esquecendo-se da laicidade do ensino, este continua a ser um erro a que urge por cobro.
Deve ser sempre possível facultar à criança a possibilidade de viver o mágico e o lúdico.
Quando do jogo simbólico, a criança apodera-se das situações e manobra-as a seu belo prazer, não se preocupando com opiniões, nem com juízos críticos vindos dos adultos. Assumindo um papel importante no equilíbrio relacional cria alteridades em que o confronto do Eu com os Outros resulta numa teia de complexas situações que vão contribuindo para o encontrar de respostas e para a resolução de problemas que as possam estar a perturbar.
Se assim não for como queremos encher salas de espetáculo quando afugentamos as crianças com experiências negativas?
Saudações LIVRE’s
Até para a semana