A Comissão Europeia aprovou, em vésperas de Natal, o Plano de Reestruturação da TAP. Quer dizer que nos autorizou a nós, portugueses, a ajudar a nossa companhia aérea com 2550 milhões de euros… desde que cumpramos certas condições, claro está, que a nossa gente é mansa. Coisa pouca e um presente de Natal para o ministro Pedro Nuno Santos, que rejubilou. Não sei explicar por que diabo não rejubilo eu, antes tenho a sensação de que nos saiu a fava do bolo-rei. Prefiro, pois, deixar a economia sossegada e voltar-me para um poema natalício de Vasco Graça Moura, onde, afinal de contas, sair-nos a fava pode até ser bom sinal:
a fava
espero que me calhe aquela fava
que é costume meter no bolo-rei:
quer dizer que o comi, que o partilhei
no natal com quem mais o partilhava
numa ordem das coisas cuja lei
de afectos e memória em nós se grava
nalgum lugar da alma e que destrava
tanta coisa sumida que, bem sei,
pela sua presença cristaliza
saudade e alegria em sons e brilhos,
sabores, cores, luzes, estribilhos…
e até por quem nos falta então se irisa
na mais pobre semente a intensa dança
de tempo adulto e tempo de criança.
in ‘O Retrato de Francisca Matroco e Outros Poemas’