Caro João Semedo, foste um dos impulsionadores do processo legislativo da despenalização da morte medicamente assistida. O processo foi longo e tortuoso, como bem sabias que ia ser. Dizias com calma: “um dia será realidade”. E esse dia chegou.
Legislou-se a dignidade e não a morte. Legislou-se a possibilidade de quem está em sofrimento, no decorrer de uma doença incurável e fatal, poder decidir, em liberdade, o momento em que quer que a sua vida termine.
Só quem não tem o mínimo conhecimento da realidade de várias doenças ou quem não tem o mínimo conhecimento das centenas e centenas de histórias de sofrimento pode ousar ser contra este ato de dignidade.
De facto, esta foi uma luta legislativa pela compaixão e pela dignidade. Uma luta pela liberdade de quem não tem qualquer esperança de cura e de quem quer fazer um pedido informado, consciente e reiterado para antecipar o momento da sua morte. Como poderíamos continuar a negar esta decisão a quem quer decidir parar de sofrer e não ter de esperar pelo tic-tac biológico angustiante?
Desta vez, Marcelo não terá qualquer alternativa que não a de promulgar a lei e o conservadorismo insensível de PSD, Chega e PCP foi derrotado de vez.
Mas, o desespero ridículo de alguns foi mais longe. Apesar do Presidente da República não ter voltado a requerer ao Tribunal Constitucional a fiscalização da constitucionalidade da lei porque não subsistia nenhuma dúvida sobre a conformidade desta lei com a Constituição, tendo feito um veto meramente político, o PSD anunciou, ainda antes da votação, que estaria disposto a subscrever um pedido de fiscalização sucessiva por parte do Tribunal Constitucional ao articulado da lei, uma intenção de pronto secundada pelo Chega. Olha que dois!
Mas o que é de sublinhar é que o bom senso imperou, e Portugal terá uma lei equilibrada e prudente, mas que respeita firmemente as escolhas pessoais sobre o fim da vida daqueles cuja doença ditou antecipadamente o seu fim.
Até para a semana!