As análises, os analistas e a realidade como percepção

Crónica de Opinião
Quinta-feira, 10 Outubro 2019
As análises, os analistas e a realidade como percepção
  • Eduardo Luciano

 

 

Cá estamos para o início da décima quarta temporada das minhas crónicas na DIANAFM (repararam na modernice da linguagem adaptada das séries televisivas?) e logo com a tarefa de falar de eleições para a Assembleia da República.

A direita toda somada voltou a não ter maioria e desta vez ficou mesmo mais longe desse objectivo. Como se comportam na política como os dirigentes desportivos se comportam no futebol ou se despedem ou se se põem a jeito para serem despedidos.

O partido vencedor não conseguiu a maioria absoluta, ficando assim dependente do acordo com outros para que as suas propostas possam ser viabilizadas.

O meu Partido perdeu deputados e ficou em condições mais difíceis para cumprir aquilo que se propõe na frente parlamentar.

Quarenta e cinco anos após a Revolução de Abril, o fascismo regressa à Assembleia da República através da eleição de deputados de duas forças políticas diferentes.

Um movimento protofascista e cariz ultra conservador viu aumentar a sua representação parlamentar para quatro deputados.

Estes são, no meu entender, os factos relevantes para analisar e discutir em função do que foi a campanha e que consequências terão para a vida de todos nós.

Nestes dias um conjunto muito alargado de comentadores têm-se desdobrado em demonstrar que, tal como o universo, a estupidez humana pode ser infinita.

Questionam-se sobre as razões que levaram a extrema-direita a obter um resultado que permitiu eleger dois deputados de dois partidos diferentes sem perceberem que uma delas é o facto de existirem comentadores como eles.

Perguntam-se como pode um partido sem programa eleger quatro deputados, inventando e imaginando motivações de eleitores, não querendo perceber que foram eles que através dos seus insistentes comentários lhe deram existência.

Voltam a condenar à extinção o Partido dos comunistas, não percebendo que outros tentaram durante 98 anos e sem grande sucesso, confundindo recuo e derrota com desistência e desânimo.

Regressam às teorias da conspiração em torno da possibilidade de alianças à esquerda, inventando compromissos prévios e obscuros.

Sabem o que me preocupa mesmo? É que a Assembleia da República vai passar a ter várias sargetas onde irão desaguar as águas do esgoto a céu aberto que são as redes sociais e é isso que vai fazer manchetes de jornais e notícias de televisão, obscurecendo ainda mais o trabalho sério e honesto de quem foi eleito com ideias, programa e projecto político.

Daqui a quatro anos virão os mesmos comentadores concluir que aqueles a quem calaram a voz não foram capazes de comunicar eficazmente.

As armas serão sempre diferentes neste combate e quem acha que é possível vencer o inimigo de classe com as regras construídas para garantir a sua continuidade no poder, através dos seus diversos representantes, ou é ingénuo ou só leu metade dos livros.

Todas as oportunidades de combate devem ser aproveitadas para conquistar espaço e melhores condições de vida para quem trabalha, mas sem perder de vista que o essencial não vem oferecido.

Até para a semana

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