Há quem diga que o poder corrompe e há quem acrescente que os corruptíveis são mais atraídos pelo poder. Não estou certo da resposta, mas sei que as relações de poder autoritárias e assimétricas promovem o clima perfeito para o abuso de poder e todas as formas de assédio.
E não fujamos ao elefante na sala, a concentração de poder machista é ainda uma realidade, o que leva, inevitavelmente, a que as mulheres ainda constituam um grupo-alvo para todo o tipo de abusos e assédio.
Mas o que é o assédio moral e sexual? O assédio moral é qualquer conduta abusiva, configurada através de gestos, palavras, comportamentos inadequados e atitudes que fogem do que deve ser aceite pela sociedade. Essa conduta abusiva, por ser repetida e sistemática, atenta contra a personalidade, dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa. O assédio sexual é quando esse tipo de conduta indesejada tem um carácter sexual, sob forma verbal, não-verbal ou física.
Falamos, muitas vezes, de um mundo de palavras ofensivas, piadas inapropriadas, desvio de valores, imposição de tarefas, chantagem emocional, ameaças diretas ou indiretas, …
Abusos e assédio que são perpetuados sem prova evidente, além do que é claramente sentido pela vítima. Falamos de práticas difíceis de provar, mas que são muito facilmente identificadas.
É por isso que, quando falamos da presunção da inocência de quem é acusado deste tipo de práticas, princípio obviamente fundamental, não podemos de deixar de dar toda a voz às vítimas, pois, na maior parte das vezes, é mesmo a sua voz a única forma de prova, de defesa e de denúncia.
Qualquer desvalorização da voz das vítimas contribui apenas para que se passe a mensagem que de todas devem ficar caladas, de que não vale a pena denunciar. Há uma parte da sociedade que as quer caladas e submissas, não tenhamos dúvidas, e é contra essa visão que nos devemos levantar.
Toda a voz e toda a atenção a quem denuncia. E, claro, todo um processo de averiguações de forma independente que procure confirmar ou desmentir as declarações da vítima, mas sem nunca desvalorizar a voz de quem tem a coragem de denunciar o que há muito é perpetuado e, tantas vezes, desvalorizado. E isso, em nada colide com a presunção de inocência do suposto agressor. É assim que devemos olhar para os abusos sexuais dentro da Igreja Católica, como é assim que devemos olhar para outro tipo de abusos denunciados, de que é exemplo mais recente o que terá acontecido no CES em Coimbra.
Sobre os casos denunciados em instituições do ensino superior, além do que já expus anteriormente, resta-me lamentar as declarações da Ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior – Elvira Fortunato. Dizer que, e cito, “estes problemas podem ser resolvidos com base na própria autonomia das instituições de ensino superior e do seus órgãos” revela inocência ou irresponsabilidade. Achar que dentro das instituições – onde as hierarquias são respeitadas, as relações de poder instituídas e a imparcialidade quase impossível – haverá uma resposta para as vítimas é de uma improbabilidade que não podemos tolerar. Fez bem Catarina Martins, em nome do Bloco de Esquerda, relembrar que existem outras soluções, nomeadamente a criação de entidades independentes das faculdades e centros de investigação, que tenham como missão recolher e analisar, de forma imparcial e objetiva, as denúncias de assédio.
Dar voz às vítimas, para que nenhuma sucumba ao medo!
Até para a semana!