O escritor, jornalista e académico espanhol Arturo Pérez-Reverte, numa entrevista a um jornal argentino, explica-nos que cada Titanic tem o seu iceberg e que a sociedade actual, entretida com a música da orquestra, não quer ver o perigo a chegar. Diz ele que “vamos pela rua a ouvir a Shakira no telemóvel… e como protegemos as focas e as baleias, o mundo já está no bom caminho. Para mais cancelámos o Woody Allen e o Plácido Domingo e agora vamos ver, em todos os filmes, duas lésbicas, um homossexual e um negro, e tudo vai bem. Porém o mundo não é assim. E quando a realidade, que acaba sempre por se impor, diz “olá, aqui estou eu”, temos jovens indefesos a quem fizemos acreditar numa série de mitos, através de filmes, internet e tudo. É absurdo. Em vez de deixarmos a explicação do mundo aos historiadores, aos arqueólogos, aos cientistas, estamos a entregá-la aos youtubers, aos oportunistas das redes sociais, aos influencers.”
E Pérez-Reverte continua, acutilante, mas amargo: “Nunca fomos tão ignorantes como somos agora. Nunca. Paradoxalmente, agora que temos um telemóvel que tem tudo. Nele, temos 9000 anos de memória, história, literatura, cultura. Tudo. No entanto, usamo-lo para mandar whatsapps.” Assim se lamenta o escritor.
Por cá, o barco também vai metendo água, enquanto a orquestra nos adormece. O estudo da história, dos clássicos da literatura e da filosofia, das humanidades, vai sendo substituído, na escola pública, pelo facilitismo e o imediatismo estupidificante. Os ecrãs substituem os livros e os teclados evitam a aprendizagem da escrita manual. As diferenças entre as massas da escola pública e as elites que frequentam as privadas, continuam a aumentar, ao arrepio das famosas promessas de Abril.