Modas do linguarejar

Nota à la Minuta
Terça-feira, 15 Setembro 2020
Modas do linguarejar
  • Alberto Magalhães

 

 

À medida que a idade avança, o meu ouvido torna-se mais sensível às modas do linguarejar, sejam as muletas do falar, sejam expressões que ouço repetirem-se a propósito e a despropósito. A muleta actual, está tão espalhada que quase ninguém dá por ela: o português de Portugal, de há dois anos para cá, tem vindo a encher-se exuberantemente com pronomes demonstrativos, até aí usados com moderação e sensatez.

Dou alguns exemplos da TV: deputada do PAN na cerimónia do 25 de Abril, “Devemos preocupar-nos com aquilo que possa ser o combate às alterações climáticas”; em Maio, a propósito de uma fila para cabazes alimentares, “as pessoas querem ser as primeiras a receber aqueles que são os alimentos de que precisam”; o secretário de Estado da Saúde, em Maio, “…à excepção daquilo que eram os doentes…”. Para terminar, uma deputada do PAN, em Junho, à saída de reunião no Infarmed, mostrou-se preocupada com “aqueles que não puderam interromper seja aquilo que seja a sua actividade profissional”.

Por outro lado, a expressão que me anda a sensibilizar de há uns meses para cá é esta: “Temos de confiar”. Temos de confiar na Justiça; temos de confiar nas autoridades de Saúde; em vésperas de abertura das aulas, dizia ao Expresso o Secretário de Estado da Educação, João Costa: “Os pais têm de confiar na Escola e nas autoridades de Saúde”. Cá para mim, anda-se a inverter a ordem dos factores. Não somos nós que temos o dever de confiar nestas e noutras instituições. Elas e quem as dirige é que têm o dever de serem confiáveis. Nós temos o direito de poder confiar nelas.

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