Sempre houve bullying na escola e fora dela. Mais numas idades que noutras. Mais numas escolas que noutras. Só que não tinha nome em inglês e, portanto, não dava nas vistas. Na minha escola primária, que me lembre, havia uma vítima: chamava-se Álvaro, era franzino, orelhas grandes, cabelo ralo… e tinha óculos. Era o único que tinha óculos, o que para alguns colegas era um desafio à uniformidade e o pretexto para uns calduços.
Mas, o pior é que o Álvaro era o aluno mais fraco da escola. A professora, a D. Delfina, tinha uma regra estrita, para só mencionar o ditado: por cada três erros, uma reguada. Ora, o miúdo tinha aos 15 e aos 20 erros por ditado, na 3ª e na 4ª classe. O que o tornava uma vítima praticamente diária da D. Delfina, não sádica, mas crente no poder motivador da disciplina. Uma coisa era certa, a minha professora estava convencida que só ela tinha legitimidade para exercer a violência sobre o Álvaro e tratava de castigar quem apanhasse a exorbitar.
Já no liceu, não me lembro de casos de bullying flagrantes. Por vezes andava-se à pancada, mas sem excessiva violência. Talvez porque, havendo segregação sexual, os rapazes não precisassem de se exibir frente às raparigas e vice-versa.
Hoje, pelo contrário, parece que os professores são os únicos realmente proibidos de exercer qualquer esboço de violência sobre qualquer aluno, mesmo que em legítima defesa.
Deixem-me confessar uma coisa: sobretudo nas últimas duas décadas, trabalhando num serviço de Saúde Mental, tive muitos casos de vítimas e, também, de agressores. Também fui convidado para falar sobre bullying em várias escolas, em eventos com grande participação de docentes e auxiliares. Porém, apesar do entusiasmo sobre o tema, foram raras as situações em que as escolas reconheceram a existência dos casos, alguns graves, identificados pela nossa equipa, nessas escolas.