Sobre o Congresso do PS, realizado no fim-de-semana passado, bastam dois comentários: os putativos candidatos a substituir António Costa – a saber, Mariana, Ana Catarina, Fernando e Pedro Nuno, a que Costa juntou, de gozo, Marta – foram expostos e expuseram-se numa cena de filme. Excuso-me de dizer de que tipo. O secretário-geral, nos seus discursos, anunciou um futuro radioso para o nosso país, prometendo a paz, o pão, a habitação, a saúde, a educação, a energia limpa e etc e tal, sem explicar como fará isso, tendo, ao mesmo tempo, de conquistar os votos dos geringonços.
Entretanto, o Tribunal Constitucional, a pedido do Presidente da República, decidiu, por unanimidade, chumbar a autêntica aberração que era a possibilidade de, em certos casos, o Ministério Público poder prescindir da autorização de um juiz para vasculhar a correspondência electrónica de um cidadão. Vergonha para a esmagadora maioria dos deputados que aprovaram a norma ou se abstiveram.
Por estes dias, Manuel Heitor, ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, resolveu abandonar a sua nulidade e dar um ar da sua graça. Assim, em entrevista a um jornal deu três pontapés no bom senso e mostrou a sua falta de preparação no domínio da Saúde.
Em primeiro lugar, desconsiderou a especialidade de Medicina Geral e Familiar, passível de precisar de menos tempo de formação que a de Oncologia a ou de Psiquiatria, por exemplo. Revelou assim uma profunda ignorância sobre a importância do clínico geral e a complexidade das suas funções como pivô de todo o sistema de Saúde. Em contraste, prometeu a valorização das chamadas terapêuticas não-convencionais, onde a ciência e a tecnologia pouco contam e onde abundam burlas e charlatães.
Por fim, insistiu na ideia peregrina de criar três novos cursos de Medicina, situados em Aveiro, Évora e Vila Real. Aqui chegados, convém dividir a questão em termos de necessidade e de viabilidade.
Quanto à necessidade, ela é muito discutível. Há falta de médicos no SNS? Há, sim senhor. Há falta de médicos no país? Não senhor. Todos os anos acabam o curso de medicina centenas de jovens. Muitos deles não encontram lugar no SNS, muitos deles resolvem emigrar. Fausto Pinto, director da Faculdade de Medicina de Lisboa e presidente do Conselho de Escolas Médicas Portuguesas considera um mito a falta de médicos em Portugal. O problema reside, segundo ele, “numa má gestão dos recursos humanos”. Pelos padrões internacionais, deve haver um curso de Medicina por cada dois milhões de habitantes, o que daria para o nosso país uma necessidade de cinco cursos. Portugal, de momento, tem oito. Se Manuel Heitor conseguir os seus intentos, até 2023, ficará com onze.
Quanto à viabilidade, tomemos o exemplo de Évora. Dizem-nos que vamos ter um novo Hospital Central. Estou capaz de apostar que não estará pronto na data prevista. Quanto a especialistas, o que tem acontecido nos últimos anos é o seu desaparecimento. Será difícil, sem uma autêntica revolução nas carreiras e remunerações, para já não falar no investimento em equipamentos urbanos e culturais que tornem atractiva a cidade, trazer para Évora professores e especialistas, capazes de montar um curso de alguma qualidade.