O Governo quebrou a tradição ao não reconduzir Vítor Caldeira no cargo de presidente do Tribunal de Contas (TdC).
A não recondução causou perplexidade e criou, mais uma vez, a sensação de que o Governo afasta dos cargos todos aqueles agem de acordo com o que a função lhes exige, e não em função dos interesses da governação.
A regra que deveria presidir para a não renovação deveria ser a avaliação do desempenho do cargo. Mas não, o primeiro-ministro inventou um critério para justificar a não renovação.
Um critério que em nada avalia o desempenho do cargo, critério que se limita a definir como razão para a não renovação o cumprimento de apenas um mandato. Enfim, um critério que explica pouco ou mesmo nada, tanto mais que o Governo não tem este entendimento para os demais cargos da administração pública, limita-se a aplicá-lo para os cargos de natureza judiciária, ainda que a lei não impeça a renovação.
Neste caso o Governo agiu de igual forma em como procedeu com a ex-Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal, quando pura e simplesmente não a reconduziu no cargo.
Aliás, no caso do presidente do TdC, pelo que é público, fê-lo com uma total deselegância, porque comunicou a não recondução por telefone.
Sabe-se agora que havia dois nomes para suceder à substituição de Vítor Caldeira, e que José Tavares terá sido o escolhido depois de Rui Rio ter sido consultado, enquanto líder da oposição, ainda que Rui Rio tenha manifestado opinião no sentido da recondução.
É evidente que Vítor Caldeira foi substituído porque o Governo pretende ter a governação das instituições, quer que elas não contrariem, não belisquem, não obstaculizem de forma alguma qualquer ação ou posição do executivo.
A substituição de dirigentes de topo, da forma como é feita, dá um sinal aos demais. Para bom entendedor meia palavra basta.
António Costa trata-nos como se fossemos todos uns idiotas. Diz-nos que a substituição acontece em razão da regra do mandato único, critério fixado por acordo entre o Governo e o Presidente da República, isto para justificar a sua ação, dividindo as responsabilidades com o Presidente da República e, neste caso, envolvendo ainda o líder da oposição, para que as críticas não lhes sejam todas dirigidas.
Mas sejamos sérios, na génese desta substituição estão posições do TdC que não agradaram a António Costa.
O presidente da CML no passado fez duríssimas críticas a posições do TdC. Recentemente as apreciações do TdC às propostas de alteração à lei da contratação pública não foram bem recebidas pelo executivo.
Neste, como noutros casos, o TdC agiu conforme devia, mas criou clivagens.
Se o TdC alertou para os perigos que as alterações à lei da contratação pública poderiam implicar, riscos de práticas ilícitas de conluio, cartelização e de corrupção, tê-lo-á feito no estrito sentido de alertar para riscos que as alterações poderão trazer, tendo o TdC como missão fiscalizar a legalidade das receitas e despesas públicas, pelo que a sua vasta experiência permite-lhe ter uma visão sobre os riscos que as alterações à lei da contratação pública podem gerar. Pelo que serão sempre recomendações que deverão ser tidas em devida consideração.
A transparência, a concorrência, o cumprimento da legalidade das despesas e a ação fiscalizadora das despesas públicas são absolutamente essenciais para evitar o compadrio e a corrupção.
Instituições fortes são sinónimo de um Estado forte.
Um Estado que não tenha instituições fortes, competentes e suficientemente isentas, com capacidade para agir, é um Estado fraco e permeável.
Ao proceder desta forma, substituindo dirigentes que conseguem ter notáveis níveis de desempenho, o Executivo não está apenas a permutar um presidente, está a enfraquecer organismos que são fundamentais ao funcionamento do Estado.
Até para a semana
Rui Mendes